Aconteceu hoje, a poucos minutos, mas pode ter acontecido mil vezes ou mais antes disso:
Eu na fila da delegacia aguardando para fazer um B.O. (nem perguntem, já está tudo resolvido e não foi nada grave), reparo que a mulher sendo atendida antes de mim está chorando enquanto relata o fato ocorrido.Desligo a música que estava ouvindo no headfone e passo a observar atentamente:
Ela é a Diana, negra, por volta de 25 anos, chora sentinda enquanto relata que um "cidadão" sem mais nem menos a abordou na rua simplesmete para xingá-la. Disse que ela era uma macaca e que tinha cabelo duro. Diana chorava sentinda, inconformada, lágrimas correndo pelos olhos, ele nem me conhece, nunca me viu, não sabe que sou deficiente... Tive muita vontade de levantar e ir dar um abraço dela, mas me contive - por padrões ridículos que estou tentando quebrar em mim. O atendente, branco e com cara de desdém ia perguntando coisas que apontavam para a culpa DELA: Você estava no meio da ciclovia? Você atrapalhou a passagem dele? Porque você estava sozinha? Você trabalha?
Ele subiu para imprimir o BO e ela ficou sentada na minha frente chorando. Finalmente consegui olhar para ela nos olhos e dizer: "Não deixe que essas pessoas estraguem seu dia, você é linda! Essa pessoa que é doente e tem os olhos podres, provavelmente tem uma vida tão ruim que só sabe maltratar os outros". Ela continuou chorando e dessa vez contou pra mim o que aconteceu, ela tinha saido para procurar trabalho, já estava voltando para casa e se deparou com esse ser desumanizado que a xingou, "sem mais nem menos". Pedi que a moça que estava limpando o chão trouxesse um copo d'água para Diana, a moça trouxe quase me xingando, como se eu tivesse pedido algo de outro mundo. Nenhum olhar de compaixão para aquela mulher chorando ali. Apenas desdém. Enviei para elas duas toda energia de amor que eu consegui me concentrar naquele momento, enviei meu abraço energético. Ela parou de chorar, mas continuou com uma cara de muuuito chateada.
Chegou minha vez de ser atendida. Comentei com o atendente "que absurdo", e ele me simplesmente disse que "a culpa é da família dela, que deixa uma pessoa deficiente sair sozinha". Não aguentei. - Como assim moço? A culpa é dessa sociedade que não dá possibilidade de educação e segurança para as pessoas. Quem tinha que não sair de casa era esse monstro sem noção que xingou ela.
De nada adiantou. Ele insistiu que a culpa é da família por deixar ela sair sozinha, que poderia ter sido muito pior, que ela poderia ter sido arrastada e maltratada. Fiquei com vontade de gritar, chorar, correr. Mas me contive ainda. Única coisa que fiz foi vir pra casa e escrever isso aqui, pelo menos é algo. Queria ter dado um abraço na Diana. Ela é tão linda. Só me restou isso. É pouco, um abraço seria melhor. Sinto muito, me perdões, te amo, te agradeço. Fim.
Imagens e textos de Auira Ariak by http://sobejando.blogspot.com/ is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial 2.5 Brasil License.
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